Vale a pena escutar estas meditações tranquilas com a certeza de que cada dia neste espaço deve ser um passo rumo a um maior nível de perfeição. Afinal, um princípio do budismo, de muitas religiões e de todas as éticas.
sábado, março 29, 2008
Ani Chöying Drolma
Vale a pena escutar estas meditações tranquilas com a certeza de que cada dia neste espaço deve ser um passo rumo a um maior nível de perfeição. Afinal, um princípio do budismo, de muitas religiões e de todas as éticas.
sexta-feira, março 28, 2008
Herculano
Grande autor do romantismo português, a sua poética é menos conhecida quando comparada com o romance histórico.
Aqui fica um excerto de «Deus»:
Eis o Tempo, o Universo, o Movimento
Das mãos sai do Senhor:
Surge o Sol, banha a terra, e desabrocha
Sua primeira flor:
Sobre o invisível eixo range o globo:
O vento o bosque ondeia:
Retumba ao longe o mar: da vida a força
A natureza anseia!
Perdidamente
É o caso de «Perdidamente», de Florbela Espanca, nas vozes de Sara Tavares e Nuno Guerreiro.
«Ter asas de condor» é, na verdade, um desafio hercúleo, mas que vale a pena aceitar! Sem perdas, sem perder, perdidamente em alguém...
domingo, março 23, 2008
Trupe Vocal
Trupe Vocal
Fátima Serro, Maria João Mendes e Kiko (vozes)
Paulo Gomes (piano); Hugo Carvalhais (contrabaixo) e Leandro Leonet (bateria)
Os Trupe Vocal são já um conceituado projecto de jazz dito «clássico», desde o “Gospel” aos ritmos da fundação americana, até à bossa nova.
Donos de vozes em que se destaca Fátima Serro, ouvir também Kiko e Maria João Mendes é sempre garantia de um pedaço de tempo muito bem passado. A isto juntem-se músicos inspirados, de entre os quais o baterista Leandro Leonet. Assim foi ontem no Servartes (http://www.servartes.com/), espaço que se vai cada vez mais afirmando pela qualidade das suas propostas musicais e das exposições que acolhe.
Pena mesmo é algum público que tem dificuldade em entender que em concertos como este, a música é para ser escutada em silêncio e não em altos berros. Cada coisa tem o seu lugar e esta trapalhada bem portuguesa de misturar tudo teve ontem um exemplo paradigmático. Quem disse que a vida de artista é fácil?
sábado, março 22, 2008
Anima Mea
«Coro Anima Mea». Amadores que são quase profissionais. Cantam com muita alma e com a beleza do divino.
O «Stabat Mater» foi constituído por uma primeira parte com peças de compositores dos sécs. XVI a XVIII, de que destaco o «In Monte Oliveti» de Fabordão. A segunda parte foi quase toda preenchida pelo «Stabat Mater» de João Rodrigues Esteves (c. 1690-1755). Os solistas deram cartas.
Ah! Tudo isto na Igreja de Sto. António das Antas, com entrada gratuita.
Com coros destes até a mim me apetece cantar! (podem estar descansados que vos poupo esse suplício!)
Das Tripas ao Coração
Lê-se de um fôlego. Apesar de já ter alguns anos, datando do Porto 2001, «Das Tripas ao Coração» é uma antologia trilingue (Português, Inglês e Francês) de poemas de autores do Porto ou que com esta cidade têm uma ligação especial, organizada por Egito Gonçalves e Rosa Alice Branco (Campo das Letras, Porto 2001, Porto: 2001).
O título diz muito deste nosso Porto: as tripas são o elo gastronómico com a cultura do coração, daquele granítico e tantas vezes bruto e brutal som da cidade que nos embala umas vezes e nos estremece outras. A escolha de mais duas línguas tenta demonstrar que o Porto, apesar de ainda preso a algum provincianismo de que se queixava Garrett, tem uma legítima pretensão de universalidade.
Deixo a minha própria selecção:
As palavras
São como um cristal,
As palavras.
Algumas, um punhal,
Um incêndio.
Outras,
Orvalho apenas.
Inseguras navegam;
Barcos ou beijos,
As águas estremecem.
Leves.
Tecidas são de luz
E são noite.
E mesmo pálidas
Verdes paraísos lembram ainda.
As recolhe, assim,
Cruéis, desfeitas,
Nas suas conchas puras?
Compêndio
Uma tarântula
Azul. Eu respondi:
Vermelhas
São as flâmulas
Das algas e o fermento
Das águas.
Escrever
É isso: fazer
Da vida uma pauta
E um compêndio de espuma.
Albano Martins
quarta-feira, março 19, 2008
Stacey Kent - a voz do divino
Uma voz cristalina, com uma dicção perfeita, percorreu alguns clássicos do jazz em inglês e francês (que bem fica esta última língua neste estilo musical!), enquanto se transpirava uma união sibilina entre os elementos da banda, em especial James Tomlinson, o marido de Stacey Kent (os restantes músicos são Art Hirahara - piano -, David Chamberlain - contrabaixo - e Matthew Skelton - bateria).
Apresentaram o mais recente disco, Breakfast on the Morning Tram, editado pela prestigiada Blue Note.
Stacey é uma excelente contadora de histórias, agora com Kazuo Ishigo como letrista. Esta cantora, nascida em Nova Iorque, iniciou a sua carreira musical em Oxford, tendo já recebido vários prémios, de entre os quais se destacam o British Jazz Award (2001) e o BBC Jazz Award (2004).
Com uma voz destas, dá-se mesmo largas ao sonho!
Aqui fica uma música (também) na nossa língua!
terça-feira, março 11, 2008
Joplin * Mercedes
Não sei bem porquê, hoje esta música não me sai da cabeça!
Não sou nada louco por automóveis, nem faço muita questão de ter um Mercedes ou um grande carrão... Já me dou por contente se a minha lata já a caminhar para velhota não me der problemas.
Talvez por isso, a letra desta música de Janis Joplin é um divinal hino contra o consumismo e contra a «inveja de vizinho».
"Mercedes Benz"
Oh Lord, won’t you buy me a Mercedes Benz ?
My friends all drive Porsches, I must make amends.
Worked hard all my lifetime, no help from my friends,
So Lord, won’t you buy me a Mercedes Benz ?
Oh Lord, won’t you buy me a color TV ?
Dialing For Dollars is trying to find me.
I wait for delivery each day until three,
So oh Lord, won’t you buy me a color TV ?
Oh Lord, won’t you buy me a night on the town ?
I’m counting on you, Lord, please don’t let me down.
Prove that you love me and buy the next round,
Oh Lord, won’t you buy me a night on the town ?
Everybody!
Oh Lord, won’t you buy me a Mercedes Benz ?
My friends all drive Porsches, I must make amends,
Worked hard all my lifetime, no help from my friends,
So oh Lord, won’t you buy me a Mercedes Benz ?
That’s it!
sexta-feira, março 07, 2008
Perguntas palermas (III)
Se «Portugal convida», porque é que nunca paga a conta? Não aprendemos que «quem paga convida?»
quarta-feira, março 05, 2008
Dicionário alternativo ou o castigo do Senhor Ministro
Antes do cumprimento da penitência, o Senhor Ministro pede para informar que "zubaida" é, de facto, como intuira GBN, uma mulher gorda, feia e mal-ajambrada. Porque o Ministro está de castigo, não há, por ora, qualquer condecoração atribuída.
Ainda como forma de aplacar o desejo sanguinário do Senhor Marquis, o Senhor Ministro pede-nos encarecidamente que divulguemos mais um desafio dessa língua tão misteriosa que é o Fornense, hoje em dose dupla:
"peladiço"
"gente xiribi".
Ajudemos este tão amargurado Ministro! O Senhor Marquis prometeu demonstrar a sua magnanimidade para com tão desventurado ser caso esta rubrica contasse com uma participação recorde!
Salvemos o Ministro!
segunda-feira, março 03, 2008
As pedras não ardem
As pedras não ardem,
os corpos não se extinguem.
Apenas tu ardes
na memória do Sonho
que vivo acordado
em sobressalto de
pedra vulcânica, doce, amargurada.
[Silêncio. Entras. Eis-te!]
Agora, as pedras já ardem!
O teu corpo já queima!
Tudo em ti exala segredo
e Vida. E Morte.
Que ardam as Pedras!
Qu'irrompa a Vida!
Idanha-a-Velha, 29.12.2007 Primeiro verso dado por rocky.
F.L.
Inspiring quotes (12)
sábado, março 01, 2008
Early Night Post (40)
Poprishchin, Ilya Répin (1844-1930)
«É que a Lua se fabrica, normalmente, em Hamburgo, e é de péssima qualidade. Admira-me que a Inglaterra não preste atenção a este facto. O fabricante é um tanoeiro coxo, e vê-se logo que é imbecil, não tem a mínima noção de Lua. Utilizou uma corda alcatroada e uns restos de azeite de lâmpada rançoso; por isso é terrível o fedor por toda a Terra, é obrigatório tapar o nariz. Daí que a própria Lua seja uma bola tão frágil que as pessoas não podem viver nela, pelo que agora só lá moram narizes. É por esta mesma razão que não podemos ver os nossos próprios narizes, uma vez que estão todos na Lua.»
Nikolai Gógol, Diário de um Louco, Lisboa: Assírio & Alvim, 2002, pp. 23 e 45, respectivamente.
Útil e inútil
Útil e inútil.
Ainda se mantinha com aquelas duas palavras na cabeça debitadas do rádio-despertador que lhe infligia o horror matinal de acordar maldisposto.
Não lhe tinha vindo à ideia a dicotomia que agora o voltava a atormentar durante o duche, momento em que o seu cérebro, após o torpor nocturno, parecia acordar e regalá-lo com brilhantes expressões, com tralha para fazer, assuntos a não esquecer e, até, pasme-se com sonhos mirabolantes. Pois, nisso dava não sonhar durante a noite.
A caminho do escritório, embrenhado em cálculos mentais para pôr a porcaria da fabriqueta a render mais uns cobres e a competir (tinha sido isso que o Primeiro afirmara em entrevista recente àquela finguelas que tem a mania que é esperta, não fora?) com os tigres (que raio de nome! Pareciam mais umas sanguessugas!) do oriente, numa rubrica de saúde, o médico de serviço (dos poucos que ainda trabalhava em urgências… como gostava ele de meter uma bucha política em tudo o que era pensamento! À sua maneira era um grito de revolta, cansativo que seria inscrever-se num sindicato ou coisa assim) dizia que era útil comer vegetais.
Sim, sim, comer vegetais. Já agora, praticar exercício físico, não comer carne, só peixinho cozido ou grelhado, não fumar, não beber, não ter sexo. Enfim, aquelas tretas que os médicos debitam e não cumprem por saberem que deixariam de ser humanos caso o fizessem.
Se bem que, deixar de ser humano depois da tampa de ontem era muito tentador. Também quem é que ia adivinhar que a tipa com ar de santinha afinal era uma interesseira que só queria uma porcaria de emprego de secretária na fabriqueta nos arrabaldes da cidade? Nem era muito bem paga…
«A taxa de desemprego voltou a subir. A Comissão Europeia recomenda…»
Bem, esta tipa da rádio anda a ler-me os pensamentos! E os bacanos da Comissão se mandassem em vez de recomendar, as coisas estariam melhor. Como diz o X, esse grande intelectualóide de esquerda punhos de renda, era importar políticos! Assim como assim, já importamos tudo e não nos importamos nada…
Ai a filha da mãe da jeitosa que estancou no amarelo! Será que esta gente não tem pressa de chegar ao trabalho? Não deve ir trabalhar… A avaliar pela bomba que tem nas mãos, deve ser dessas dondocas que só levam os pirralhos ao colégio…
Isso, agora espana por aí fora…
Fazia então bem à saúde comer vegetais. Era útil, pelo menos a quem desejasse viver mais uns anos. E valeria a pena? O aquecimento global, o degelo, o efeito de estufa e essas coisas todas que os ambientalistas agora erguem como bandeiras e que até dão prémios a ex-presidentes do maior poluidor mundial, tornariam útil a vida neste planeta? E útil era o quê, afinal? Que jeito lhe dava ter estado mais atento às aulas da stôra de Filosofia do secundário, em vez de espreitar pelo decote da Y, com um belo par de matéria-prima pronta a sair daquele top musculado que agrilhoava aquelas hormonas prontas a encontrar abrigo no seu acne borbulhoso. Hum, que imagem linda…
Desligou a ficha e ligou à terra onde não se pensava em nada, mas simplesmente se acompanhava a mudança de velocidades com uma carregadela na embraiagem do citadino barato que lhe servia de lata e que comprara em suaves prestações mensais a uma TAED estupidamente elevada com o dinheiro que a avó (que Deus a tenha em eterno descanso) lhe havia deixado em boa hora às portas da morte. Esta de a morte ter portas faz dela uma espécie de casa, talvez mesmo com janelas, móveis, biblots, carpetes, cortinados, portiers. Quem morará nessa casa? O Diabo? O Diabo e os Santos em alegre convívio? Sorrira levemente, erguendo o lábio superior daquela maneira sexy que usava como arma de arremesso sempre que conhecia uma miúda nova. Mas não queria desenvolver a ideia da morte, de uma casa e de um eventual paralelismo sórdido entre o fim da vida e bairros pobres ou chiques. Deixaria isso para quem, àquela mesma hora, estaticamente na China, estaria a ter a mesmíssima ideia, só que em outra língua, ou melhor, em outro idioma que se projectava em ondas sonoras que ecoavam na caixa craniana pois, ao que consta e ele se apercebesse, o seu pensamento ainda não fazia barulho.
Entrara no edifício, designação demasiado simpática para um casebre em madeira e tijolos já velhos que albergavam dois recém-licenciados que estavam para descobrir aquela fórmula que faria do algodão importado uma espécie de seda mais barata e que lhe daria a tal vantagem competitiva. Pelo menos assim gostava de pensar ao vê-los embrenhados em pipetas e tubos de ensaio. Mesmo que tal não acontecesse, os miúdos ficavam baratos com os programas governamentais que existiam, reforçados em véspera de eleições. Benditas manifestações soberanas do poder do Povo escolher livremente, em sufrágio directo e universal, os seus lídimos representantes na casa comum da Democracia!
Que belo discurso! A minha mãe sempre disse que eu estava bem era na política…
Fábula do país adormecido
Era uma vez um país muito antigo que, em «depressão major», chegou a uma encruzilhada. Como em vários locais de (in)decisão, duas placas indicando a «Terra do Faz-de-Conta» e a «Terra da Realidade».
A decisão afigurava-se grave: ia-se (sobre)vivendo em estado pré-comatoso (comatoso?) induzido pela pletora arcaica de achaques e arrebiques de passados lautos engalanados com candeeiros de fuste e chiques camas de dossel, tudo seduzindo para um mundo rosa de riqueza mantida à custa de balões de oxigénio contaminado, chamados «bancos», propagandeando regaladas férias ao sol, princesas e príncipes perfeitos, cidades de chocolates e galáxias de brinquedos.
Escolher a realidade implicaria optar pela bruxa má e pelos monstros feiosos que obrigavam os meninos a despender energias em projectos concretizados à medida das migalhas de bolachas que se tinha no bolso. O terror maior era, porém, dar razão à irritante formiga trabalhadora e aforradora, bem como queimar em lume inquisitorial inapagável o papel de figurante do tal país em que se podia ostentar uma superioridade ociosa escondida sob um mando de inferioridade coitadinha de fado inelutável, mesmo que esse papel amiúde terminasse com oiro, pimenta e cravinho transformados em incómodas complicações gástricas.
Estava o dito país de Inês posto em desassossego quando soaram incómodos barulhos de exércitos de esfomeados, estropiados e demais classes malcheirosas. Anunciavam uma crise social profunda, uma perda de identidade e de espírito gregário de um povo partilhando, até ali, língua, cultura (?) e etnia similares, tidas por poção mágica contra qualquer mal.
Estremeceu o país e quem carregava o leme, ansiando por um milagre ao jeito de umas pequenas crianças em aldeia perdida nas serranias. À falta de intervenção divina, por ali passou um mocho escolástico debitando teorias e análises multifactoriais, por horas discursando. Embevecido, o país deu vivas e ordenou a construção de um estádio com o nome do mocho. Todavia, logo perscrutou que nada mudara por duas razões: estava sobretudo acostumado ao imobilismo e soavam mais fortes as rocas dos bandos urrantes.
De novo atando as mãos à cabeça, pejorando contra divindades e amaldiçoando bolorentas bonomias seculares, o vento de Leste trouxe uma chita magra e simpática que, após amena cavaqueira, engoliu o tal país e, engordada, seguiu em frente, por uma terceira via dita progressista, humanista e sensível a profundos sentimentos sociais.
E assim, no interior da barriga da ágil chita, limitando-se a escolher o melhor lado onde estender o travesseiro, o tal país viveu feliz para sempre.