segunda-feira, maio 07, 2007

Saudade ou um dia pleno

Hoje foi um dia muito preenchido. As emoções começaram ao acordar e só há pouco se acomodaram para preparar um descanso nocturno que se adivinha docemente melancólico.
O meu irmão é finalista e hoje não pude deixar de me comover ao vê-lo trajado com as fitas desfraldadas e com aquele brilho nos olhos de quem vence uma etapa.
De tarde, na minha Faculdade (que bom é este sentimento de pertença), as lágrimas estiveram por um fio ao contemplar os novos licenciados que conheci desde os primeiros anos e que tive a honra de ter como alunos. Tantas emoções, tantas recordações.
Recuei 12 anos àquele dia em que entrava num mundo novo chamado “Universidade” e logo me vieram à lembrança os risos, as alegrias, os olhares cúmplices daqueles que comigo partilharam o sonho e a realidade de uma Casa que vimos nascer e que, como tantos outros que vieram depois de nós – e tantos mais que lá estão e lá estarão –, ajudamos a fazer crescer. Os fados de despedida – a fonte perto da qual se amaldiçoa a sorte que nos deixa partir com o bater da “velha cabra” em eterna memória – levaram-me até ao dia 7 de Maio de 2000, no qual nos impuseram cartola e bengala, à semelhança do que hoje sucedeu por todo o País.
Peguei no livro de curso que organizámos e comecei a percorrer as suas folhas, relembrando os amigos que hoje estão por aí disseminados, espero que ocupados a serem felizes. E não pude deixar de parar na folha em que, sorridente, uma querida colega enfrentava o futuro com a serenidade estampada no rosto.

Essa colega foi tolhida do nosso convívio pouco tempo depois.
É para ela – eu sei que ela está a ouvir – que deixo alguns trechos de um pequeno discurso que os finalistas de então quiseram oferecer naquele dia a todos quantos lhes deram a honra de com eles partilhar aquele momento único. Tal como hoje.

Como já alguém escreveu, “ninguém caminha sozinho”. (…) Aos verdadeiros Amigos que fomos cativando e que levamos para a Vida bem guardados no coração, agradecemos a Solidariedade, os braços sempre abertos e a suavização dos espinhos que fomos encontrando ao longo desta caminhada, comprometendo-nos a que essa Amizade se renove e fortaleça daqui para a frente. (…) Como se lê na maior parte das fitas rubras que agora esvoaçam, os cinco anos de curso passaram de forma repentina, como é apanágio desse inexorável ser que é o Tempo (…). Em relação ao nosso futuro, estamos conscientes das dificuldades com que iremos deparar. Todavia, recusamos liminarmente qualquer perspectiva dantesca (…). Prometemos trabalho, dedicação, honestidade e simplicidade, na certeza de que o sucesso e a realização pessoal “dependem mais do que temos na nossa cabeça do que nos nossos bolsos” (Schopenhauer). (…) Se é verdade que aqui comemoramos o fim de um ciclo das nossas vidas, não podemos encarar este dia (…) como a morte de uma parte de nós, mas sim como um novo ponto de partida para uma etapa por certo mais exigente, porém agora reforçada pelos ensinamentos transmitidos, pela Amizade, bálsamo da nossa existência, e pelo Amor dos nossos familiares. (...) parafraseando Paulo Coelho, que sejamos “como o rio que transborda e não como o tanque que contém sempre a mesma água!”.

6 comentários:

rtp disse...

Gostei muito de ler este post. Até porque retrata, na sua essência, o meu estado de alma no dia de ontem.
Só o segundo parágrafo ainda é estranho para mim. O meu maninho é mais novito e ainda está a meio do curso, mas certamente será uma ocasião muito feliz. :-)
Parabéns para o teu irmão e felicidades para a nova etapa!
Quanto ao resto, posso dizer que senti todas as palavras. Ver cartolar mais um conjunto de alunos que conhecemos num contacto quase diário de vários anos é sempre um momento sempre emociante e nostálgico!
E a homenagem final é muito linda!

P disse...

A emoção de gerações que nos sucedem, de quem fomos professores, o entusiasmo perante a vida, a não consciência da fugacidade da vida, a doce e vital ilusão de que se chegou enão de que se está sempre a partir, tantas vezes.
(Apenas tenho pena que os poucos alunos que vou tendo (é a crise das universidades em algumas áreas...) não se vibrem com o que vão fazer e sejam, muitas vezes, autómatos cinzentos preocupados em cumprir. Desculpem, T&L, o desabafo mas, como não concebo a vida sem chama, sem alma, sem emoção, custa-me alguma apatia reinante à minha volta.)

A homenagem é emocionante. Algumas pessoas são mesmo estrelas cadente, desenhando um traço no noso céu e sendo subtraídas aos nosso olhos precocemente. Todos temos as nossas. A verdade é que já nos deslumbraram... já marcaram. sigam em paz o seu percurso, algures onde apenas não as podemos ver.
Um abraço

P disse...

Desculpem algumas gralhas no com. anterior.

verde disse...

De facto um post muito bonito. O dia do último cortejo marca o fim de uma fase de vida, o início de outra. Sentimos-nos como se fosse o último dia de aulas. Hoje, quando falaste do cortejo do teu irmão fui invadida por uma onda de saudade e por instantes revivi o meu último cortejo, momentos que guardei como que fotografia. Muitos parabéns ao teu irmão. Este é o principio do resto da sua vida :)

x disse...

os começos deixam-me sempre feliz. começos que temos até ao fim.essa melancolia não é mais do que a confirmação daquilo que vamos deixando para trás mas com os olhos na linha do infinito.começos para uns, etapas ultrapassadas para outros é sempre bom ver a complementaridade da vida.parabéns*

Mr. Sherlock disse...

Eu nunca vou esquecer essa mítica primeira aula fantasma, nem a outra, a primeira a sério, em que alguém decidiu deixar-se levar pelo pesado das pestanas, correndo o risco de desencorajar quem se iniciava nas lides de docencia que tão bem tem desempenhado.
Mea culpa