(Continuado de post anterior)
Aproximava-se um daqueles cães que, por certo, pertencia ao coro de latidos que escutava sempre que semicerrava os olhos e lhe vinha à lembrança (por assim dizer…) o rosto de uma mulher robusta, forte e inteira, de seios firmes e lábios carnudos, sobre quem matutava até hoje. Mais um esquecimento a juntar àquele que lhe sujava o pijama de um amarelo vivo e que, após uma quentura inicial, se transformava em ácido sabor de palmada pela manhã, por alturas em que aquela mulher insistia em despi-lo e em enxugá-lo de impurezas, mesmo aquelas que, pretas, se incrustaram há largo tempo naquilo a que se convencionara chamar “alma”.
Já sentia o nariz frio do animal quando se encontrou com a placa de cimento limpo e asseado que, e Vianen, se dizia ser “o chão”.
À roda, uma velha desdentada, um jovem com aquelas coisas nos ouvidos, uma miúda ladina e um homem já calvo trajando fato. Ninguém lhe tocava. Mal sabiam que o toque era tudo o que ansiava…
Deve ser um daqueles velhos do lar, dizia a petiz ladina. Anuía o executivo, enquanto o jovem pegava no telemóvel (afinal dava jeito!) e ligava para não sei onde… Fora o jovem a chamar a ambulância. Não qualquer um dos adultos, o que mais uma vez provava a actualidade e a correcção da parábola do bom samaritano. Só não sabemos de onde era o samaritano, pois de Samaria apartado em léguas estava.
Um momento, que fiquei sem sentidos – ao menos sensoriais.
Retomo o copo de cerveja preta azeda que pedi em Utrecht, mais precisamente na rua Wed, num “pub” escuro e com dois cães pequenos e malhados que fazem as delícias de uma mulher típica da Holanda central e do seu amigo (?) que, ao balcão, passa boa parte do dia convencendo-a das vantagens em deitar-se com ele. Ao menos é isso que percebo dessa língua estranha em que se expressam. Ah! O tipo parece que é Frank. Chega mais gente e os pequenos canídeos lambem-me as mãos depois de um dia de reunião em que quase sempre me senti “off-side”.
Os pequenos bichos começam rituais de acasalamento perante a bonomia de todos. Está na hora de deixar este espaço. Tornou-se demasiado claustrofóbico para mim e para o meu estimado e companheiro de longa data complexo de culpa.
Pago. E nessa precisa altura decido que vou tirar o meu pai do longínquo campo de morte a que o condenei. Sem mais. Mesmo que isso me custe o casamento.
Afinal o velho mijão sempre se foi! Realmente, estava a ver que nunca mais! Vagou uma cama, então. Parece que há mais um português na Lista.
20.11.2008
Utrecht – Rua Wed – Pub Heen & Weer
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