Realização: Jorge Paixão da Costa
Elenco: Ivo Canelas, António Pedro Cerdeira, Rogério Samora, Giselle Itiê, Flávio Galvão, José Pedro Vasconcelos, Nicolau Breyner, Bruna di Tullio, James Weber Brown, João Miguel Rodrigues e João Lagarto.
Portugal/Brasil, 2007.
Sítio oficial: http://www.filmesfundo.com/omisteriodaestradadesintra/.
Originais das cartas em: http://purl.pt/34/2/.
É no meio desta crítica de costumes a uma sociedade monárquica e farta da política (o conde de Abranhos também aparece), com lascivas condessas, lúgubres primos, oficiais garbosos, maridos cornudos e cubanas fogosas, que a película de Jorge Paixão da Costa se desenrola.
As referidas cartas – enviadas entre 24/7/1870 e 27/9/1870 – fizeram do Verão lisboeta um dos mais tórridos da época. A avidez do público era engrossada pelo anonimato dos escritores – apenas desvendado dois meses após a publicação do primeiro episódio –, a que acrescia uma estranha semelhança da ficção romanesca com a realidade. A crítica satírica e corrosiva de costumes de Ramalho e Eça (em tempos, professor e aluno no Colégio da Lapa, no Porto) fez mesmo surgir um surto de paranóia colectiva (comparável , porventura à actual «Floribella») que afastou várias pessoas dos caminhos para Sintra.
O romance «O mysterio da estrada de Cintra», publicado em 1884, relata acontecimentos que serviram de base ao realizador que lhes juntou uma perspectiva da amizade entre Ramalho Ortigão e Eça de Queirós, integrada na «Geração de 70» e na luta contra o Romantismo, a qual retrata com correcção a ténue linha entre a Amizade pura e o ódio mais comezinho.
As interpretações de Ivo Canelas (Eça) e de António Pedro Cerdeira (Ramalho) são de bom nível, especialmente a do primeiro actor, encarnando um Eça como o imaginamos: altivo, cáustico e com traços físicos bem marcados (o «Fura-Vidas» da SIC,
O som é péssimo – os nossos realizadores ainda não dominam as técnicas de conjugar a voz dos actores com o som que o público deve apreciar; as «décalages» são constantes. Nota positiva para a fotografia, embora a iluminação seja fraquita. Como alguém dizia no final, a banda sonora era demasiado previsível e, acrescentamos nós, até mesmo «pimba» dentro do género clássico.
O filme custou 2,3 milhões de euros. Para o preço exigia-se mais, principalmente ao nível do acordar de consciências e da crítica de comportamentos e preconceitos sociais. Bem vistas as coisas, o género humano, as suas volúpias, desejos inconfessados e traumas são os mesmos, estejamos em 1870 ou em 2007.
A RTP (que não a nossa treteira!) anuncia a rodagem de uma mini-série intitulada «Os novos mistérios da estrada de Sintra», realizada pelo mesmo Jorge Paixão da Costa, e que se propõe acompanhar o enredo desde o séc. XIX à actualidade. Veremos se aí há rasgo para os aspectos que gostaríamos de ver retratados.
5 comentários:
Obrigada Filipelamas acabou de me poupar 4€!!!
Exactamente porque tinha intenção de ver o filme, resolvi esta semana reler o clássico folhetim. Mas, se é assim como diz, acho que não vale o trabalho de ir ao cinema sobretudo depois de ter lido a história (à qual dificilmente algum filme fará justiça.
Já a série "nome de código: sintra" que a RTP - a outra ;-) - exibiu recentemente, uma adaptação livre d'o Mistério, era bastante interessante e "bem feita" e só tive pena de não ter conseguido acompanhar.
Pegando na sua deixa, proponho que o T&L produza "O Mistério na Estrada de Perosinho" baseada na história do rapto da Floribella que a leva a uma casa onde jaz morto o talento para representar... ;-)
Bom FDS!
Cara Thumbelina,
à parte dos defeitos do filme, este tem as suas qualidades e acima de tudo, tendo em conta as condições dos filmes portugueses em geral, não acho que este seja um filme menor. Você é que sabe se vale ou não a pena, e para isso terá de visioná-lo.
Não estou a querer contrariar a opinião postada neste blog. Estou só a querer dizer que há coisas boas que compensam certas menos boas.
E se o cinema português não tiver audiências, como é que você quer que o nivel de qualidade possa aumentar? Não se esqueça que a Warner e a Paramount não financiam os nossos filmes.
Um grande bem haja.
Nuno Diogo.
Cumpre esclarecer que o comentário não teve por fim retirar espectadores ao filme, mas tão-só veicular os seus pontos fortes e fracos. Como em todos os filmes, portugueses ou estrangeiros.
Obrigado pela visita, Nuno Diogo.
Também vi o filme. Concordo com a apreciação de filipelamas. Parece-me, aíás, que das suas palavras não se retira a ideia ou conselho de que não se deva ir ao cinema ver este filme.
Destacam-se várias interpretações como se diz no post. Eu sublinho a prestação de Ivo Canelas.
O argumento é muito interessante. Por partir de factos reais. Por nos levar ao encontro de um outro (o mesmo?) país. Por nos pôr em contacto com as palavras de Eça e de Ortigão. Por nos transmitir a essência vida moderna ("Fazer tudo à pressa!").
E sendo um filme português excedeu as minhas expectativas, quanto à luminosidade (normalmente é tudo tão escuro!), ao ritmo (não tão demasiadamente lento como a maioria), ao teor jocoso (sem cair numa toada de mau gosto: o que acontece com excessiva frequência, quando se trata de uma comédia).
Saí da sala do cinema com vontade de o recomendar. Apesar de ter reparado em inúmeras deficiências, que me parecem (a mim que sou leiga) relativamente fáceis de eliminar. Mais estupefacta fiquei quando vi que o orçamento não era tão assim tão magro.
Acalmem-se as hostes!
Não sou assim tão sugestionável ;-)e não nego à partida um filme que desconheço!
É que já ouvi a mesma opinião de várias fontes - e fidedignas - e a desilusão é uma constante...
Normalmente, costumo preterir filmes estrangeiros em favor de portugueses no que toca à escolha no cinema (o que também já me valeu alguns insultos por parte de amigos ... lol) mesmo até porque, infelizmente, não há outras oportunidades de os ver - raramente passam mais tarde nas televisões nacionais.
Por outro lado, não acho que tudo que é nacional é bom ou que tudo o que é nacional é mau.
E também acho que em nada favorece o cinema português o argumento de que "para filme português" ou "para o orçamento, condições, etc." até está muito bom.
Anyway, para tirar as dúvidas vou tentar ver o filme!
Ps: este comment foi feito ao abrigo do Direito de Reposta. LOL
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