Encontrava-me na sala envidraçada de um restaurante cujo excessivo despojamento acabava de censurar quando ouvi uma voz que inundou aquele ambiente de uma doçura acolhedora e inebriante, não mais me recordando do vazio da luz fria de há pouco. Doçura entrecortada por uma força determinada e segura. Força acalmada por uma chuva acariciante de tons cristalinos.
Era Eva. Eva Cassidy.
O disco chamava-se «Live At Blues Alley». Logo que o consegui, ouvi-o, enfeitiçada, vezes sem conta, imaginando uma Eva de raça negra, bem sucedida e segura do seu valor, ideia reforçada pelo gospel «How can I keep from singing?» do disco «Wonderful World». No entanto, quando procurei a restante discografia e alguns dados biográficos mal pude acreditar: Eva, uma loura tímida e de aspecto frágil, falecera havia dez anos e vivera os seus trinta e três anos praticamente incógnita.
Eva nasceu, em 1963, em Maryland, nos E.U.A., com um talento especial para a pintura e para a música, apesar de nunca ter verdadeiramente acreditado nele, reflectindo uma insegurança que nunca a deixou. Participou em vários grupos musicais amadores e apenas aos 27 anos formou um grupo profissional – a Eva Cassidy Band. Não desejava ser uma cantora profissional, mas apenas cantar as suas músicas predilectas.
A primeira impressão que fica do seu repertório é o carácter ecléctico, já que Eva canta numa variedade de estilos que vão desde o jazz, o blues, a folk e o gospel até à pop. Esta característica constituiu, aliás, um entrave ao seu sucesso comercial. As editoras discográficas recusavam-se a produzir um disco sem um estilo definido, incapaz, na sua opinião, de fidelizar públicos determinados. Eva, porém, escolheu cantar apenas as canções que a emocionavam, independentemente do seu estilo. O seu talento não residia na escrita ou na composição musical, mas sim na interpretação, aliada à capacidade para fazer arranjos musicais criativos e inesperados. Nas suas mãos e na sua voz, as músicas mais banais tornavam-se inesquecíveis. Em vida, apenas produziu dois discos: «Live At Blues Alley» (1996), uma publicação de autor que antecedeu em apenas 4 meses a sua morte, e «Eva By Heart», lançado já postumamente (1997).
A voz é cristalina e delicada (ouça-se a canção folk «Waly Waly»), mas cheia de alma. É impossível ser indiferente a Eva ao ouvi-la cantar “You’ll remember me when the west wind moves / Among the fields of barley / You can tell the sun in his jealous sky / when we walked in fields of gold”. Sting não ficou, segundo reza a história.
Escassas semanas antes da morte prematura de Eva Cassidy, praticamente já sem energia, os amigos organizaram um concerto em sua homenagem em que lhe pediram para, mesmo assim, cantar uma pequena música que não exigisse muito de si. Surpreendendo todos, escolheu a sua magnífica versão de «What A Wonderful World”, arrancando dos pulmões os últimos sopros que lhe restavam para cantar as suas derradeiras notas de amor pela música, de alegria, de esperança, de amizade e de reconhecimento por tudo o que a vida e os amigos lhe haviam dado. Vale a pena redescobrir Eva.
“And I think to myself what a wonderful world...”
Era Eva. Eva Cassidy.
O disco chamava-se «Live At Blues Alley». Logo que o consegui, ouvi-o, enfeitiçada, vezes sem conta, imaginando uma Eva de raça negra, bem sucedida e segura do seu valor, ideia reforçada pelo gospel «How can I keep from singing?» do disco «Wonderful World». No entanto, quando procurei a restante discografia e alguns dados biográficos mal pude acreditar: Eva, uma loura tímida e de aspecto frágil, falecera havia dez anos e vivera os seus trinta e três anos praticamente incógnita.
Eva nasceu, em 1963, em Maryland, nos E.U.A., com um talento especial para a pintura e para a música, apesar de nunca ter verdadeiramente acreditado nele, reflectindo uma insegurança que nunca a deixou. Participou em vários grupos musicais amadores e apenas aos 27 anos formou um grupo profissional – a Eva Cassidy Band. Não desejava ser uma cantora profissional, mas apenas cantar as suas músicas predilectas.
A primeira impressão que fica do seu repertório é o carácter ecléctico, já que Eva canta numa variedade de estilos que vão desde o jazz, o blues, a folk e o gospel até à pop. Esta característica constituiu, aliás, um entrave ao seu sucesso comercial. As editoras discográficas recusavam-se a produzir um disco sem um estilo definido, incapaz, na sua opinião, de fidelizar públicos determinados. Eva, porém, escolheu cantar apenas as canções que a emocionavam, independentemente do seu estilo. O seu talento não residia na escrita ou na composição musical, mas sim na interpretação, aliada à capacidade para fazer arranjos musicais criativos e inesperados. Nas suas mãos e na sua voz, as músicas mais banais tornavam-se inesquecíveis. Em vida, apenas produziu dois discos: «Live At Blues Alley» (1996), uma publicação de autor que antecedeu em apenas 4 meses a sua morte, e «Eva By Heart», lançado já postumamente (1997).
A voz é cristalina e delicada (ouça-se a canção folk «Waly Waly»), mas cheia de alma. É impossível ser indiferente a Eva ao ouvi-la cantar “You’ll remember me when the west wind moves / Among the fields of barley / You can tell the sun in his jealous sky / when we walked in fields of gold”. Sting não ficou, segundo reza a história.
Escassas semanas antes da morte prematura de Eva Cassidy, praticamente já sem energia, os amigos organizaram um concerto em sua homenagem em que lhe pediram para, mesmo assim, cantar uma pequena música que não exigisse muito de si. Surpreendendo todos, escolheu a sua magnífica versão de «What A Wonderful World”, arrancando dos pulmões os últimos sopros que lhe restavam para cantar as suas derradeiras notas de amor pela música, de alegria, de esperança, de amizade e de reconhecimento por tudo o que a vida e os amigos lhe haviam dado. Vale a pena redescobrir Eva.
“And I think to myself what a wonderful world...”
8 comentários:
A espera pela estreia da nossa Rocky foi mais do que recompensada com este MAGNÍFICO post, cehio de música e poesia.
E posso corroborar o enfeitiçamento que a voz de Eva Cassidy causa. Foi a Rocky que me deu a conhecer esta magnífica cantora. É a Voz e um "je ne sais quoi" que transforma toda a música em que toca numa sonoridade muito bela e original. A voz de Cassidy apropria-se das canções. Sedenta de mais música e de mais informaçõa sobre Eva, tal como tu, fiquei muito surpreendida com a história de vida da frágil Cassidy.
Sim ,vale a pena ouvir Cassidy (eu ouvi vezes sem conta o "Live at blues Alley") e ler posts como este. :-)
Sim, que mundo maravilhoso este em que a nossa Rocky publica o seu 1.º post neste que é também o seu espaço. E que post! Sabia que tinhas um excelente gosto musical e que escrevias muito bem, mas devo dizer que superaste as minhas expectativas (e olha que eram altas!). Muito bem conseguida a descrição da musicalidade de Eva entrecortada (para usar uma palavra tua) por um gostoso sentimento de quem escreve de modo não asséptico. E essa, para mim, vai sendo a característica mais importante de cada um de nós. Passar pela vida e deixar uma marca. Boa ou má. E tu já deixaste a tua! Agora siga para o próximo post!
bem-vinda :)
Durante uma das minhas viagens na blogoesfera deparei com uma imagem da Eva e estacionei no seu post.
Li o seu comentário e deparei-me com as suas surpresas sobre Eva e a sua vida.
Também eu me surpreendi, quando em 1999, numa viagem a Amesterdão e em conversa com um baterista amigo do Alto Jazz Cafe, tive conhecimento da sua partida.
Eva era uma dessas pessoas normais, cuja voz e a roupagem da sua música nos fazia sentir diferentes por breves instantes. A sua carreira é o epílogo do aristotélico comentário "Há mais vida para além da morte..." e de que as nossas acções suplantam o microcosmos na nossa existência.
Bem haja e boa música.
TraumatismoCraniano
NOTA: Se gostou da voz da Eva, deixo aqui algumas sugestões igualmente agradáveis.
Experimente ouvir a Judy Niemack, ou a Astor Gilberto e porque não a portuguesa Jacinta, em tons mais graves e fortes, mas de uma grande honestidade musical.
Caro traumatismocraniano: muito obrigada pelas sugestões.
Traumatismocraniano: será que me podia dar alguma dica sobre onde conseguir algum cd da astor gilberto? É que numa pesquisa que fiz pelas lojas de discos não consegui encontrar nem um único exemplar!
Cara Rocky, julgo que traumatismo craniano queria dizer Astrud Gilberto. Se assim for, é fácil encontrar a discografia dela à venda. De qualquer modo, posso emprestar-te um cd: "Look to the rainbow" .
A rtp é fenomenal! Tem sempre a palavra certa (e o CD!!) no momento certo. Não regatearei a oferta.
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