domingo, novembro 19, 2006

Curtas sobre metragens - Viúva rica solteira não fica


Viúva Rica Solteira Não Fica

Realização: José Fonseca e Costa
Argumento: João Constâncio, Mário de Carvalho, José Fanha, José Fonseca e Costa e Augusto Sobra

Elenco: Bianca Byington, Cucha Cavaleiro, José Raposo, Rogério Samora, Ricardo Pereira
Portugal / Brasil. 2006. 135 min

Argumento que podia ter sido escrito por Eça, filme que podia ter sido realizado por Almodovar ou outro dos “donos” do chamado “cinema de Autor”. Certo é que “Viúva Rica Solteira Não Fica” conta com a escrita sagaz, inteligente, mordaz e de crítica acertada de costumes (ridendo castigat mores, já dizia o nosso Gil Vicente) de João Constâncio, Mário de Carvalho, José Fanha, José Fonseca e Costa e Augusto Sobral e com a profissional realização de José Fonseca e Costa.

O cineasta já merecia um filme assim, capaz de retirar o cepticismo com que muitos portugueses (nos quais me incluo) encaram o cinema que por terras lusas (Casa da Ínsua, neste caso) se vai fazendo. Subsidiado – como quase toda a nossa Cultura (dado preocupante) –, a película percorre o final do séc. XIX e o início do século passado, acompanhando a história de D. Ana Catarina (Bianca Byington), filha de D. Francisco de Silgueiros, nobre emigrado no Brasil (fica a dúvida se se teria dedicado ao tráfico negreiro) e que regressa ao solar de origem onde - figura que me aparece central - o Sr. Abade (José Raposo irrepreensível, certamente a alma do filme) se esforça por estabelecer a ponte entre o divino e o profano, sempre auxiliado por uma excelente ama de D. Ana Catarina (Cucha Carvalheiro).

É genial o modo como a prática de crimes (Conde de Fallorca – Diogo Dória –, Capitão Malaparte – Rogério Samora – e Williamson – Anton Skrzypicie) é justificada com tautologias, com silogismos e teologia "de trazer por casa", num retrato a traço fino e fiel de um certo clero que desconfio não ter ainda desaparecido, mormente no interior do nosso País.

Ana Catarina vai matando sucessivos maridos até que atinge a felicidade junto a Adriano, afilhado (filho?) do abade (Ricardo Pereira uns furos acima das novelas, porém ainda com muito caminho pela frente), feito barão por uma realeza que se aproxima do fim e que desata a vender títulos.

A direcção de actores é eficaz e a fotografia, não sendo o melhor do filme, é suficiente. Os planos surgem em regra acertados, porventura necessitando, aqui e além, de um pouco mais de vivacidade a acompanhar um magnífica banda sonora.

Mais do que provar que os filmes portugueses também são de bom nível, com humor interessante e que não cedem à piada fácil, “Viúva Rica Soleira Não Fica” vale pelo argumento que nos transporta para o melhor que a nossa literatura já produziu em termos de crítica social e prova que as co-produções luso-brasileiras podem ser, de facto, frutuosas.

Rematando – e parafraseando o filme –, o problema daquele mundo (e do nosso) é “haver muitos copos”: leia-se, muito sítio onde nos revermos.

Vá lá, toca a ir ao cinema e usar o “slogan” de umas antigas bolachas: “o que é nacional é bom”!

4 comentários:

rtp disse...

Ouvi Bianca Byinton que protagoniza o filme, no domingo passado, no programa "Dias Levantados" de Ana Sousa Dias, na Antena 2. Já tinha vontade de ver. Agora não vou perder!

Anónimo disse...

É daqueles que só o título dá vontade de ir ver, mas, como "os recursos são escassos" há que arranjar tempo e não ir ao engano.Devo dizer que também suspeitava que fosse uma coisa algo quierosiana... Assim, com a recomendação de um conaisseur está dado o empurrão que faltava pra eu ir ver o filme!

Obrigada pela dica!

PS: de notar que a Viúva Negra dá pelo nome de Ana Catarina ... Uiiiiiiiiiiiii

rocky disse...

Também eu já vi a «Viúva rica...». O meu entusiasmo foi menor que o do filipelamas, mas houve momentos e aspectos que foram bastante positivos.
Achei o desempenho do José Raposo brilhante no papel do típico padre de província que, para além de bom garfo (e bom copo...) lida de forma astuta com os conflitos terrenos.
Já quanto aos conflitos morais, pareceu-me bem conseguida aquela cena em que o padre dá uma volta completa às angústias morais e existenciais da protagonista, utilizando um raciocício silogístico, cujas conclusões retiradas das premissas maiores e menores são claramente duvidosas, mas eficazes no apaziguamento dos males da alma!
Quanto ao nome da dita protagonista, parece-me que, para quem ainda não viu o filme, só augura candura e graciosidade: não significa «Ana» «Cheia de graça, a benéfica» e «Catarina» «pura»? Já a personagem em questão, como verás, däumelinchen, nem sempre faz jus aos nomes que carrega.
Anyway... confesso que gostei mais desta crítica ao filme do que do próprio filme!!

Anónimo disse...

Cara Rocky,

Devo esclarecer que o remark não foi feito com intuito de denegrir as Anas Catarinas! Muito pelo contrário, parece que a personagem em questão é aquilo a que se pode chamar "PODEROSA!" com sotaque brasileiro!!! Por isso mesmo tem toda a minha admiração e estima. Mais, quando for grande quero ser como ela